Sebastião Soares
Houve um momento, em nosso País , em que os nossos sonhos se juntavam aos sonhos de todos os jovens do mundo. Houve um tempo no qual as nossas esperanças eram os mesmos desejos dos que lutavam para derrubar a Ditadura Militar, dos que iam às ruas contra a Guerra do Vietnam e imaginavam que não houvesse nem infernos nem céu abaixo ou acima de nós, e que, também, reafirmavam os ideais libertários de uma irmandade de pessoas compartilhando o mundo todo. E juntos, lá estivemos. Deixando os nossos protestos nos muros, marcando a nossa resistência com enfrentamentos, colocando as nossas vidas pelas causas revolucionárias de um mundo melhor, mais humano, mais justo, mais fraterno e solidário.
E você também esteve, Fernando Gabeira, em ações legítimas e heróicas, que já se incorporaram nos grandes relatos das nossas lutas por justiça social; você que demonstrou a coragem digna de acreditar que poderíamos ir mais longe, pois, dizíamos, “ousar lutar, ousar vencer”. E vencemos. A ousadia dos que lutaram e foram presos, torturados e exilados, como você, que não fugiu e enfrentou a longa noite de arbítrio e prepotência que se abateu sobre nós, serviu para denunciar ao mundo as iniquidades dos porões e atrair os olhares das democracias ocidentais para os crimes dos governos militares no Brasil; nós, que ousamos vaiar os maviosos acordes de Sabiá, nos emocionávamos e resistíamos com a melodia que denunciava os “... soldados armados, amados ou não, quase todos perdidos com armas na mão..” E se ousamos lutar, ousamos vencer. E vencemos. Com o canto de multidões, de milhões, em grandiosos comícios pela restauração da democracia, nos quais a Nação se uniu e nos unimos, “vendo o nosso sonho teimoso se realizar”.
Construímos com o nosso caminhar a longa estrada que nos levou à eleição, pela primeira vez, de um trabalhador operário como presidente do Brasil. “Nunca antes na história do nosso País” uma façanha dessa magnitude havia se realizado. E esse operário, que não poderia errar, esse operário metalúrgico cuja escola foi a vida e a militância sindical, que não tinha diplomas das vetustas e arrogantes universidades nacionais, que não era doutor nem bacharel, muito menos intelectual ou coronel, soube cuidar do povo. Semeou universidades e escolas técnicas, como frutos cultivados na terra fértil; emancipou da necessidade indigna e da miséria populações que antes eram vítimas da bomba maligna da fome; elevou o País ao cume das principais nações do mundo; por isso mesmo, por suas obras e feitos valorosos, tornou-se, entre os presidentes, o mais popular da nossa história, desconstruindo o perverso modelo neoliberal, entreguista e excludente do governo que o antecedeu; um governo que você, também, o combateu e que agora, Gabeira, você o toma como seu!
Quem diria, hein. Vê-lo ao lado do que há de mais pérfido e prepotente da política brasileira; observar a sua foto ao lado daqueles que se utilizam de métodos sórdidos e anti-humanos para desqualificar e caluniar pessoas íntegras e bem intencionadas; a sua imagem junto a políticos pretenciosos e arrogantes que se escondem em hotéis luxuosos para, em tenebrosas transações, assinar protocolos de vendas, a estrangeiros, de empresas fundamentais para o nosso desenvolvimento social e econômico, indispensáveis à nossa soberania intelectual. Talvez tenha razão Millor Fernandes ao afirmar que “de onde menos se espera é que não sai nada mesmo”.
Ao observar as imagens, estampadas nos grandes boletins a serviço da ganância insaciável de demos e tucanos, pouso dizer: apesar de vocês, venceremos. E em homenagem à consciência da nova juventude, fico triste ao saber que você, ex-Companheiro Gabeira, não terá admiração nem respeito, será apenas o arquivo deletado, esquecido e superado, quando a história esvaziar a lixeira, para inscrever no pórtico das nossas bandeiras, o hino de um novo tempo, com Dilma, a primeira mulher brasileira, presidente da Nação inteira.
(A Nina, mãe, mulher e guerreira; com muito amor pela vida inteira.)
Sebastião Soares
Filósofo, escritor, jornalista, professor e dirigente sindical.
Blog: imprensaliberdade.blogspot.com
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